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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

TU-114, O MAIS IMPRESSIONANTE TURBO-HÉLICE DA HISTÓRIA

O fabricante russo Tupolev criou as aeronaves turbo-hélice mais impressionantes da história. Inclusive, a aeronave que foi o maior avião comercial de passageiros em serviço no mundo durante os anos 1960: o Tu-114 Rossiya.
tupolev1Imagem: Reprodução Moddb.com
A aerodinâmica dos Tu-114 era muito avançada, com asas enflechadas a 35° – com um desempenho muito bom, pois quase se igualava ao dos jatos contemporâneos como o Boeing 707 e o Douglas DC-8. Sua velocidade máxima era de 470 Kt (870 Km/h), teto de até 39 mil pés e uma autonomia de 6.200 Km.
Até hoje, este é considerado um desempenho espetacular para uma aeronave turbo-hélice. O peso máximo de decolagem era de 175.000 Kg, bem maior que o do Douglas DC-8-63, a segunda maior aeronave de passageiros do mundo dos anos 1960 (161.000 Kg).
Vale destacar que o Tu-114 foi concebido a partir da aeronave militar Tu-95 (veja um post especial sobre o projeto aqui no blog), um bombardeiro estratégico de longo alcance. O modelo era equipado com quatro monstruosos motores Kuznetsov NK-12MV, cada um deles gerando cerca de 14.800 SHP e girando um par de hélices contra-rotativas coaxiais.
tupolev2Imagem: Reprodução Wikipedia
Antes de efetivamente entrar em serviço, os russos fabricaram duas aeronaves Tu-116, que eram bombardeiros Tu-95 convertidos para aeronaves de passageiros. Estes modelos experimentais operaram algumas rotas dentro da ex-URSS, até serem substituídos pelos Tu-114, de fuselagem muito mais larga e muito mais confortáveis.  Ao todo, 31 aeronaves Tupolev Tu-114 Rossiya chegaram a ser fabricadas.
O maior usuário comercial do Tu-114 foi a Aeroflot, a empresa aérea nacional soviética. Curiosamente, o modelo também foi operado pela Japan Airlines (JAL), configuradas em duas classes com um confortável arranjo de 105 assentos.
tupolev3Imagem: Reprodução Cultura Aeronáutica
Devido ao grande diâmetro das hélices, o trem de pouso era muito alto. A partir do nariz, chegava a três metros de altura. Era tão alto que, em uma viagem de testes para Washington (EUA), que precedeu a primeira visita do Premiê Nikita Khrushchev ao país, não foi possível arrumar uma escada que alcançasse as portas do avião!
Em seu deck inferior ficavam as galleys e as acomodações dos tripulantes (os “sarcófagos”), ideia reeditada mais recentemente em alguns modelos Airbus A340. As hélices, devido à grande velocidade do avião, giravam a 750 rpm – e mesmo assim produziam um grande ruído, já que as pontas das pás operavam em velocidade supersônica, sendo a maior parte da tração em cruzeiro fornecida pela metade interna das pás.
Aliás, talvez o Tu-114 tenha sido o avião comercial mais ruidoso de todos os tempos, superando até mesmo o Concorde. Foi inclusive o ruído extremo que limitou a sua velocidade – se empregassem a potência máxima de cruzeiro, o avião seria simplesmente insuportável para seus passageiros. (Aliás, há registros de que muitos tripulantes dos Tu-95 militares tiveram severas perdas auditivas.)
O Tu-114 poderia voar, se dependesse do desempenho de seus motores, à “True Air Speed” (TAS), ou “Velocidade Verdadeira” de 500 Kts (925 km/h), mais rápido que a maioria dos jatos comerciais de hoje, exceto o Boeing 747. Os aviões voaram em rotas internacionais entre Moscou e Paris, Belgrado, Kopenhagen, Montreal, Nova Delhi e Tóquio (em parceria com a JAL). Um modelo de longo alcance, o Tu-114D, conseguia voar entre Moscou e Havana sem escalas.
Quando os Tu-114 foram substituídos nas principais rotas internacionais por jatos Ilyushin Il-62, na década de 1970, passaram a servir rotas domésticas de alta densidade, com um apertado e desconfortável arranjo de 220 poltronas.
As aeronaves foram desativadas em 1976 e foram usadas por algum tempo pela Força Aérea Soviética, mas poucos exemplares foram preservados. O mais conhecido deles está no Museu de Monino, em Moscou.
tupolev4Imagem: Reprodução Cultura Aeronáutica
Deixando seu legado também na história da aviação nacional, um Tupolev Tu-114 veio ao Brasil trazendo o cosmonauta Yuri Gagarin para uma visita (Gagarin chegou ao Brasil em 29 de julho de 1961, quando foi condecorado pelo Presidente Jânio Quadros com a Ordem do Cruzeiro do Sul por sua façanha de ser o primeiro homem no espaço).
A aeronave pousou nos aeroportos de Viracopos, em São Paulo, e Brasília. A altura da aeronave causou o mesmo constrangimento que Khrushchev passou nos EUA: nenhuma escada alcançava as portas e tiveram que improvisar a saída dos tripulantes.

LEGACY 500: surpreenda-se com o novo Laboratório Voador do GEIV

De fora, parece um avião qualquer. Mas, não é. A décima-quinta aeronave da linha de produção da Embraer cognome Legacy 500 (EMB550) é diferente. Completamente adaptada pela FAB para uso do Grupo Especial de Inspeção em Voo (GEIV), atende agora também pela designação da Força Aérea:  IU-50.
Legacy 500 taxiando na pista do Santos Dumont antes de chegar  no batismo da aeronave no GEIV (Foto: Fábio Maciel)
Legacy taxia na pista do Santos Dumont pouco antes de chegar à solenidade de apresentação no GEIV (Foto: Fábio Maciel)
Com um laboratório de grande porte embarcado em seu interior, o avião foi remodelado e instrumentalizado para, em voo, aferir todo e qualquer um dos instrumentos de auxílio de voo e procedimentos de navegação aérea em operação no País. Verificar e, quando necessário, corrigir a precisão dessas infraestruturas que viabilizam o voo por instrumento no território nacional. 
A primeira das seis novas unidades do IU-50 que irão compor a nova frota do GEIV aterrissou no Santos Dumont hoje, dia 23, com pompa e circunstância. Iniciará o processo de substituição dos Bandeirantes, já obsoletos para a função, oferecendo uma infinidade de novos recursos e funcionalidades. Tecnologia de ponta, alta performance, design moderno, sistemas embarcados de última geração, a nova menina dos olhos do GEIV começará a mostrar serviço imediatamente e promete dizer a que veio.
Cabine de Comando do Legacy 500 (Foto: Fábio Maciel)
Cabine de Comando do Legacy 500 (IU-50) (Foto: Fábio Maciel)
Mas afinal, o que essa belezura de traços firmes e curvas longilíneas tem de tão especial? Como é o seu desempenho no ar? Qual é sua capacidade operacional? Qual o ganho para a atividade de inspeção?  Quais benefícios confere à tripulação? 
O Blog SobreVoo sai na frente e destrincha as principais particularidades do “Legacy 500 –  IU-50”, revelando os mais importantes predicados deste laboratório voador, fabricado e montado no Brasil. 
De brasileiro para brasileiro: o melhor 
Com o avanço da tecnologia, sobretudo a transição para um voo cada vez mais digitalizado e orientado por sistemas satelitais, novos recursos de navegação, comunicação e vigilância aérea surgiram e foram aprimorados ao longo dos últimos anos. Particularmente, os procedimentos de navegação aérea (trajetórias de voo homologadas, com um objetivo de voo específico) incorporaram modernas tecnologias que exigem equipamentos compatíveis a bordo das aeronaves a fim de monitorar e indicar, com precisão, desvios mínimos do avião em relação à trajetória de voo prevista.
Aeronave estacionada no pátio do GEIV (Foto: Fábio Maciel)
Aeronave estacionada no pátio do GEIV (Foto: Fábio Maciel)
O Legacy 500 é uma aeronave executiva, midsize (médio porte), com motorização turbofan Honeywell HTF7500, bimotor com alcance intercontinental. Ao optar pelo modelo da Embraer, a FAB equipou – conforme suas necessidades operacionais – um modelo que já fora concebido para romper paradigmas, ao destoar da concorrência na classe midsize, desde suas primeiras entregas em 2014. É uma aeronave maior, mais rápida, com mais autonomia, melhor pressurização e alcance superior que as demais. 
Alçado à vanguarda do que existe de mais atualizado no mundo para a atividade, o GEIV projetará internacionalmente a inspeção em voo e a indústria aeronáutica brasileira.
Motorização turbofan Honeywell HTF7500
Motorização turbofan Honeywell HTF7500

Inspeção em Voo Fly-by-Wire
O Legacy 500 é o primeiro modelo midsize com uso 100% de tecnologia Fly by Wire: sistema eletrônico que transmite
os comandos do piloto – a partir do cockpit – aos flaps, leme e outras partes móveis do avião digitalmente. E não mais por meio de cabos, roldanas e peças de transmissão mecânicas. 
Quando acionados pelo piloto, esses sistemas inteligentes transmitem a informação a partir de cálculos complexos, evitando, por exemplo, que comandos excedam os limites estruturais do jato e proporcionam um substancial aumento da confiabilidade de voo. Sem cabos e roldanas de transmissão, há também sobra de espaço e uma diminuição no peso de decolagem. O controle da aeronave ganha em precisão, a manutenção fica mais simples e, por extensão, a carga de trabalho da tripulação é aliviada.
Piloto usa a tela touch screen para executar uma operação de voo (Rockwell Collins - divulgação)
Piloto usa a tela touch screen para executar uma operação de voo (Rockwell Collins – divulgação)
A tecnologia, até então, só estava disponível em jatos comerciais de grande porte ou jatos executivos maiores, de custo mais elevado. Por ora, a frota do GEIV será a única do mundo a dispor de aeronaves-laboratório fly-by-wire.

Mais Capacidade para a Inspeção
Embarcado no avião, o sistema de inspeção em voo UNIFIS 3000, da NSM – Norwegian Special Mission, será capaz de aferir todos os procedimentos de navegação aérea em operação atualmente, em especial os afinados ao conceito de Navegação Baseada em Performance (navegação aérea orientada por satélites, grosso modo). 
INterface do Sistema de Inspeção em Voo UNIFIS 3000, instalado no interior do Legacy 500 (Foto: Fábio Maciel)
Interface do Sistema de Inspeção em Voo UNIFIS 3000, instalado no interior do Legacy 500 (Foto: Fábio Maciel)
Neste caso, incluem-se os de alta precisão, como o RNP AR (Required Navigation Performance – Authorization Required). Os procedimentos do gênero, até então publicados pelo DECEA, foram homologados pelo GEIV com um piloto inspetor da unidade a bordo de aeronaves de companhias aéreas, em função indisponibilidade desa capacidade na antiga frota. O Legacy IU-50 está apto a inspecionar os auxílios e procedimentos de navegação que se fizerem necessários.
RNP AR 0.3
RNP AR 0.3

Mais inspeções em um só voo 

O IU-50 proporcionará importantes ganhos operacionais ao GEIV. Entre os seus concorrentes, o Legacy 500 é a aeronave que precisa de menos pista para pouso e decolagem, bem como a que possui maior autonomia de voo. 
Resultado: com um alcance de voo de 5.787 Km (3.125 NM) e a necessidade de apenas 1.245 metros (4.084 pés) de pista para decolagem, o Legacy 500 consegue partir completamente abastecido do Rio de Janeiro rumo a qualquer aeroporto da região norte do país sem pouso intermediário para reabastecimento, o que não é possível com as aeronaves atuais do GEIV.
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Naturalmente, quanto maior a autonomia de voo, maior o alcance da aeronave. Consequentemente, melhor o aproveitamento da missão, com mais inspeções em voo para cada decolagem realizada.
Perceba, na ilustração abaixo, o raio de alcance do Legacy 500, a partir de uma decolagem de São Paulo.
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Aumento da Consciência Situacional 
Outro destaque é o aumento da consciência situacional da tripulação. As telas de 15 polegadas do painel de comando (as maiores entre os jatos da classe) permitem a visualização de cartas de navegação georeferenciadas, grafismos de orientações para voo por instrumento, imagens das superfícies/relevo virtualizadas, além de outras importantes informações ao longo do voo.
O SVS – Synthetic Vision System (em português, Sistema de Visão Sintética) proporciona ao piloto uma melhor consciência da operação, sobretudo, em condições de baixa visibilidade e no sobrevoo de territórios desconhecidos. O sistema integra um banco de dados de terrenos e relevos, visualizados em tempo real, conforme a localidade da aeronave. O SVS oferece ao piloto uma visão tridimensional altamente detalhada do solo sob o seu avião, ainda que em condições de voo por instrumento com visibilidade nula.
Imagem viabilizada pelo Synthetic Vision System
Imagem viabilizada pelo Synthetic Vision System

Aeronaves disponíveis por mais tempo
Há um aspecto importante quanto à logística das operações das aeronaves do GEIV. Para efeito de comparação, enquanto o jato Hawker HS800X e o Bandeirantes IC-95 (ambos da atual frota do GEIV) precisam ser inspecionados a partir de 200 e 150 horas de voo, respectivamente, o Legacy 500 será inspecionado a cada 750 horas de voo. 
Essa diferença de tempo substancial irá impactar nas operações. Aumentando o intervalo entre essas averiguações, aumenta-se em igual proporção a disponibilidade das aeronaves, que irão operar por mais tempo.
Caberá, ao Parque de Material de Aeronáutica do Galeão (PAMA-GL) o gerenciamento do Contrato de Suporte Logístico do IU-50.
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Aviônicas entre as mais avançadas do mundo
O sistema de aviônica do Legacy 500 é o Rockwell Collins ProLine Fusion, considerado um dos mais avançados do mundo.
Altamente intuitivo, proporciona ampla consciência situacional ao piloto. É um sistema expansível de modo a satisfazer as futuras exigências tecnológicas do setor aeroespacial. Inclui, entre outras, as seguintes funcionalidades:
  • Quatro telas LCD de quinze polegadas (alta resolução) com representação de visão sintética, resolução do terreno e de obstáculos
  • Interface homem-máquina incluindo capacidade gráfica para planejamento de voo
  • Sistemas integrados de informação de voo (IFIS) com boletins eletrônicos, mapas aperfeiçoados e leitor de documentos
  • Sistema de gerenciamento de voo (FMS) com precisão expandida e aproximação vertical guiada por localizador (WAAS/LPV) e performance de navegação requerida (RNP)
  • Sistema de vigilância de tráfego com capacidade para vigilância dependente automática por radiodifusão (ADS-B)
  • Capacidade de rede, permitindo interoperabilidade para sincronização de sistemas da aeronave (e de solo) nas atualizações de banco de dados e manutenção.
O Sistema de Aviônica Rockwell Collins ProLine Fusion já foi selecionado para 17 plataformas de aeronaves, entre elas o futuro avião de transporte/abastecimento da FAB, o KC-390, também fabricado pela Embraer.

Qual distância mínima um avião deve manter ao voar acima de outro?

É natural que ao olharmos para cima tenhamos uma certa presunção de infinitude. A imensidão do céu parece coração de mãe: sempre cabe mais um. Mas não é bem assim. Se até a primeira metade do século passado voar era um luxo para poucos, de lá para cá o transporte aéreo decolou em uma curva ascendente, cujo crescimento – este sim – não tem limites.
Airbus A320 pousando no Aeroporto de Guarulhos (Foto: Luiz Eduardo Perez)
Ao longo dessa evolução, mais aeronaves passaram a dividir o mesmo espaço, voando pelas mesmas rotas, usando as mesmas trajetórias de aproximação, subida e descida. Não à toa, para garantir a segurança dos voos e asseverar uma distância mínima entre as aeronaves, a Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), órgão regulador da atividade da ONU, passou a estabelecer padrões e requisitos que originaram os valores para separações mínimas entre os voos.
Separação, aliás, é um termo recorrentemente utilizado no controle de tráfego aéreo. Empregado para considerar as distâncias entre aeronaves – ou entre aeronaves e obstáculos – para evitar colisões em voo ou ainda acidentes gerados por fenômenos secundários como, por exemplo, uma esteira de turbulência.
Os padrões de separação entre os voos no mundo baseiam-se nas disposições expostas no capítulo 5 do Doc 4444 da OACI (Procedimentos para o Gerenciamento do Tráfego Aéreo). Excepcionalidades à regra, quando houver, são externadas em publicações aeronáuticas próprias de cada país.

Separações numa mesma aerovia

Há três tipos de separação: horizontal, longitudinal e vertical. Neste post, abordaremos a última. Antes, porém, vamos rever o conceito de aerovia.
Ilustração simbólica das rotas que cruzam a Europa, norte da África e Oriente Médio.
Conforme expresso em documentação do DECEA, uma aerovia é toda área de controle, ou parte dela, disposta em forma de corredor. Uma trajetória desenhada sobre coordenadas do espaço aéreo, com informações específicas (identificação, posicionamento, rumo, altitude, etc), destinada ao voo de uma aeronave. Nos mapas (cartas aeronáuticas) essas aerovias são representadas por um simples traçado. Uma reta. No entanto, ela é bem mais do que este tracejado e deve ser compreendida numa perspectiva mais tridimensional. Isso porque diversas aeronaves podem voar ao mesmo tempo sobre essa mesma aerovia. Porém, em altitudes diversas. Tecnicamente falando, em diferentes níveis de voo (Flight Level – FL).
Explico: suponhamos que aerovia tenha uma altitude mínima de 15 mil pés (4.500 m) e máxima de 24 mil pés (7.300 m). Nesse caso, um avião poderia cruzá-la a 15 mil pés de altitude (em aviação, dizemos: FL 150, onde FL = Flight Level), outro a 16 mil pés (FL 160), outro a 17 mil pés (FL 170), outro a 18 mil pés (FL 180) e assim por diante. Desse modo, com a devida licença à imaginação, podemos pressupor uma aerovia como um muro imaginário, formado por tubos horizontais empilhados, dentro dos quais voariam aeronaves. Estranho? Pois assim é no mundo inteiro. E já há algum tempo.
Para ilustrar, vamos a esta filmagem de dentro do cockpit de um Boeing 777. Voando a 33 mil pés de altitude (aprox. 10.000 m), o cinegrafista filma – no mesmo instante – um Boeing 747 a 35 mil pés (aprox. 10.600 m) e um Boeing 737 a 37 mil pés (aprox. 11.200 m). Todos exatamente na mesma aerovia.
Por esta lógica, a distância entre os “tubos empilhados” definirá a separação vertical dos voos, certo? É mais ou menos por aí. É como se cada aerovia tivesse diversos andares e em cada um deles pudesse voar uma aeronave. E cada um desse “andar”, digamos, fosse um nível de voo (Flight Level – FL310, FL320, FL330…)

RVSM – Reduced Vertical Separation Minimum

Hoje em dia, na grande maioria dos casos, a separação vertical mínima entre aeronaves em voo é de 1000 pés (300 m). Mas nem sempre foi assim. Os mínimos de separação já foram maiores e vem caindo ao longo dos anos graças a evolução da tecnologia. Até pouco tempo, por exemplo, aviões na fase de voo de cruzeiro – do FL290 (8.800m de altitude) ao FL410 (12.500m de altitude) – tinham de manter uma distância mínima de 2000 pés (600 m) entre si.
Aeronaves na fase de aproximação para pouso em Brasília (Foto: Luiz Eduardo Perez)
Os altímetros não tinham a precisão atual, sobretudo em grandes altitudes. Foi somente em novembro de 1990, na sétima reunião do Painel de Revisão do Conceito Geral de Separação (RGCSP) da OACI, que se chegou a um consenso para a implementação do “Mínimo de Separação Vertical Reduzido” (RVSM – Reduced Vertical Separation Minimum) para altitudes entre o FL290 e o FL410.
Em outro exemplo, no vídeo abaixo, veja as aeronaves voando no sentido oposto do avião do cinegrafista, na mesma aerovia, ora mil pés acima, ora mil pés abaixo. 
Essa redução dos mínimos não se deu de uma hora para outra. Anos se passaram até o completo cumprimento de todas as etapas e dos requisitos reivindicados pela OACI. Ela foi possível graças à melhoria dos sistemas altimétricos das aeronaves mais modernas e a exigência de certas condições operacionais: uso de transponderTCAS, capacitação de tripulação, entre outros. Assim, a separação já adotada até a altitude de 29 mil pés, estendia-se até os 41 mil pés, originando 6 novos níveis de voo
Atualmente, na maior parte do espaço aéreo do globo, voa-se com uma separação vertical mínima de mil pés até os 41 mil pés de altitude (basicamente o alcance da aviação civil). Veja, na figura abaixo, como funciona a distribuição dos níveis e sentidos de voo de uma aeronave no espaço RVSM.
Ainda assim, os voos RVSM são até hoje monitorados diariamente pelas 13 agências regionais da OACI . São as chamadas RMAs (Regional Monitoring Agency), organismos criados para monitorar as separações verticais das aeronaves em voo no mundo, desde que estas foram reduzidas para mil pés. Distância então estabelecida como suficiente para um avião voar acima do outro com segurança.
Como toda regra, no entanto, há exceções. Aeronaves pesadas exigem maiores separação de aeronaves leves. Um gigante voador como o Airbus A380, por exemplo, não pode voar sobre um jatinho executivo a mil pés de separação vertical. Do contrário, a aeronave mais leve sofrerá os indesejados e severos efeitos da chamada “esteira de turbulência” – fluxo de ar e arrasto criados pelo deslocamento da aeronave mais pesada

Tudo sobre os Controles de Aproximação (APP – Approach Control) brasileiros

Ao falarmos de controle de tráfego aéreo, normalmente a associação às torres de controle é imediata. Não é para menos, ela que salta aos olhos dos passageiros no aeroporto.
Controlador operando as novas consoles SAGITARIO do APP-Rio de Janeiro (Foto: Fábio Maciel)
Ocorre que há bem mais coisas entre um pouso e uma decolagem do que se possa supor e uma delas é: a maior parte do controle aéreo não é exercido a partir de uma Torre, mas, sim, de outros órgãos menos famosos, como, por exemplo, o “Controle de Aproximação” (ou APP – Approach Control) e o “Centro de Controle de Área” (ou ACC – Area Control Center). Neste post, vamos falar sobre Controle de Aproximação (APP).

Portão de entrada e saída das aerovias

Em linhas gerais,  APP (Controle de Aproximação) é um órgão operacional que presta os serviços de controle de tráfego aéreo basicamente em três ocasiões do voo:
  1. Após a decolagem, quando a aeronave inicia os procedimentos de subida que a levarão a uma aerovia (voo de cruzeiro).
  2. Antes do pouso, quando a aeronave deixa uma aerovia (voo de cruzeiro) para iniciar sua descida rumo a um aeródromo.
  3. Aeronaves que estejam em trânsito, cruzando o espaço aéreo sob a jurisdição de um APP.
Após decolar do Santos Dumont, o piloto encerra o contato com a Torre  e imediatamente entra em contato com o APP-Rio de Janeiro para dar início ao procedimento de subida. (Foto: Fábio Maciel)
Em outras palavras, excetuando os voos que somente cruzam a região, um APP lida com a fase intermediária entre a decolagem e o “voo de cruzeiro”, e, o caminho contrário, quando o avião precisa deixar a “estrada” (aerovia) para começar a descer.
Pois bem, este espaço intermediário tem nome. Na verdade, dois:
CTR (Control Zone) –  Zona de Controle
Espaço aéreo que abrange as trajetórias dos procedimentos de aproximação e saída dos voos por instrumentos, envolvendo um ou mais aeródromos. A CTR possui, na maioria das vezes, um formato cilíndrico, desde o solo até uma altitude variável. São representadas nas chamadas Cartas de Área (ARC –Area Chart), disponíveis no Portal AIS Web.
TMA (Terminal Control Area) – Área de Controle Terminal
Situada em regiões de grande densidade de tráfego aéreo, geralmente ao redor de aeroportos importantes, a TMA é um espaço aéreo controlado que abrange os acessos (chegadas e saídas) às aerovias. É uma área mais ampla que a CTR (pode aliás conter uma ou mais delas), abarcando todos os procedimentos de chegada e saída dos aeródromos nela inseridos.
As TMA também têm limites laterais e verticais variáveis e podem ser visualizadas nas cartas ARC, disponíveis no Portal AIS Web.  Para ilustrar observe, na figura abaixo, a ARC relativa à  região de Belém, no Estado do Pará. O epicentro das demarcações em círculo é o aeroporto internacional da capital paraense Val-de-Cans – Julio Cezar Ribeiro. O segundo círculo menor corresponde à CTR-Belém, espaço aéreo circular de 28 Km de raio, do solo a 2.500 pés (726 m) de altitude, abrangendo a circunvizinhança do aeroporto.
Já o círculo maior, com cerca de 110 Km de raio, dos 2.500 pés (726 m) aos 14.500 pés (4.5420 m) de altitude, representa a TMA-Belém, espaço aéreo mais amplo que não abrange o solo. Reservado às subidas dos aviões após a decolagem, às aproximações para pouso ou, eventualmente, ao cruzamento de aeronaves que voam em baixa altitude na região..

E o que se faz dentro de um APP?

Um APP (Controle de Aproximação) presta os serviços de controle de tráfego aéreoe de informação de voo às aeronaves que voam dentro de uma TMA ou CTR. Este trabalho tem por objetivo:
  • Manter as separações mínimas entre os voos estabelecidas pelo órgão regulador (DECEA) por critérios de segurança e eficiência.
  • Disciplinar, acelerar e manter ordenado o fluxo de tráfego aéreo.
  • Orientar e instruir as aeronaves na execução dos procedimentos de espera, saída e chegada, estabelecidos pelo DECEA.
Em condições ideais, o APP deve viabilizar às aeronaves que partem um rumo com o menor número possível de curvas,  manobras e restrições até o nível de cruzeiro. Da mesma forma, a intenção é prover às aeronaves que chegam os procedimentos mais rápidos e simples.
A ordenação eficaz, segura e sustentável desses voos, porém, requer um monitoramento criterioso e em tempo real não só de aeronaves, mas das inúmeras variáveis que impactam essa circulação. Afinal, há uma conjunção de fatores, condições e protocolos a serem observados para um voo seguro. Fenômenos meteorológicos adversos, demandas de voo urgentes, situações de emergência, voos alternados, mudanças climáticas repentinas, aeroportos fechados para pouso e decolagem, redução ocasional de capacidade operacional, esteiras de turbulência… São inúmeras as contingências que podem impactar à aviação.
TMAs e CTRs dos arredores de Rio de Janeiro e São Paulo, ilustradas em uma carta aeronáutica
De todo modo, um APP lida com os procedimentos de navegação aérea básicos de uma TMA/CTR, tais como os de:
–  Chegada por instrumentos – STAR – Standard Terminal Arrival
–  Descida por instrumentos – IAP – Instrument Approach Procedure
– Saída por instrumentos – SID – Standard Instrument Departure
–  Aproximação perdida MA – Missed Approach
É também  sempre bom lembrar que, apesar do nome, o “Controle de Aproximação” atende naturalmente a qualquer aeronave em sua área de responsabilidade, estejam elas se aproximando do aeródromo ou não.  Estas áreas (TMA ou CTR) costumam a ter como centro, o aeródromo mais movimentado de uma grande cidade ou capital que, então, empresta o nome a seu APP: APP-Belo Horizonte; APP-Manaus; APP-São Paulo; APP-Fortaleza; etc. Não à toa, todas as capitais das 27 Unidades Federativas do País (incluindo o DF) tem um APP para chamar de seu. Outras cidades, entretanto, que dispõem de uma concentração elevada de movimentos aéreos também dispõem do Controle.
No Brasil há atualmente 42 APP: 28 sob a responsabilidade do DECEA, 13 com a Infraero e 1 sob a responsabilidade da Marinha. Eles estão distribuídos em todo o Brasil e atuam sobre 40 Áreas de Controle Terminal (TMA) e  2 Zonas de Controles (CTR). Veja na figura abaixo, o mapa das TMA brasileiras.
Fonte: CGNA
Ao longo de todo o ano de 2016, mais de 2,5 milhões de voos passaram pelas TMAs brasileiras. Cerca de 1/3 desses voos couberam somente às duas TMA mais movimentadas do País: São Paulo e Rio de Janeiro. Em seguida vêm as grandes capitais do Centro-Sul e Nordeste do País. Cidades como Pirassununga (TMA da Academia da Força Aérea) e Anápolis, porém, também se destacam, devido ao alto número de voos militares. Veja o ranking nacional na infografia abaixo.
Fonte: CGNA


Modernização

Recentemente, os APP brasileiros vêm passando por um processo de reformulação que envolve a implementação de novas tecnologias e infraestruturas operacionais. Uma delas é o novo sistema de consoles radar – Sistema Avançado de Gerenciamento de Informações de Tráfego Aéreo e Relatórios de Interesse Operacional (SAGITARIO). O recurso – que substitui a interface antiga,“X-4000” – emprega soluções inovadoras para o controle ao integrar uma série de dados e informações aeronáuticas numa mesma interface, desde antes da decolagem ao estacionamento da aeronave no aeroporto de destino.
Desenvolvido pela Atech (Grupo Embraer), numa parceria com a Força Aérea Brasileira, o SAGITARIO foi criado com a participação dos profissionais que atuam na linha de frente do controle aéreo e proporciona um conjunto de recursos operacionais de apoio à tomada de decisão, conforme recomendações dos organismos reguladores da aviação civil internacional.

Novo APP Salvador

Salão Operacional do novo APP-Salvador (Foto: Fábio Maciel)
O Controle de Aproximação de Salvador é um exemplo de APP recém modernizado. Desde de 28 de março, o centro, que já dispunha de um radar terminal, opera com o SAGITARIO. O novo APP foi construído em um salão operacional da nova sede do Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de Salvador. Completamente remodelado, o DTCEA está instalado ao lado do pátio do Aeroporto Internacional Luis Eduardo Magalhães, o mais movimentado do Nordeste. Na sala, cinco modernas consoles de tráfego aéreo estão dispostas em torno da mesa do Supervisor do Controle. Cada console aloca dois profissionais.
Controladores na nova console do APP-Salvador (Foto: Fábio Maciel)
A Área de Controle Terminal (TMA) de Salvador foi também completamente reformulada, inclusive sua área de extensão que agora atende às necessidades do moderno conceito de Navegação Baseada em Performance (ou PBN, Performance Based Navigation). O PBN viabiliza que as aeronaves realizem aproximação de alta precisão orientadas por satélites e não mais, somente,  por sinalizadores e balizadores VHF instalados no solo. Dentre os ganhos operacionais, destacam-se o maior número informações dispostas no console e agilidade nas ações rotineiras dos profissionais, identificando e informando situações de conflitos. Abaixo, a ARC Salvador, com a nova TMA da capital baiana, de formato não circular.
Nova TMA Salvador representada na Carta de Área ARC
Atualmente, dos 22 APP brasileiros com operação radar, 15 já utilizam as novas consoles do SAGITARIO. Ainda em 2017 estão previstas a modernização dos Controles de Aproximação de Porto Velho, Rondônia, e Cuiabá, Mato Grosso, que passarão a operar  com o SAGITARIO. Segundo o cronograma da Comissão de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo (CISCEA), a previsão é de que o SAGITARIO seja implementado em outros oito APP nos próximos dois anos, totalizando 25 Controles de Aproximação operando com sistema até o final de 2019