sexta-feira, 18 de abril de 2025

Boeing E-7 e Embraer E-99M: uma comparação analítica

 

 os Boeing E-7 “Wedgetail” a serviço da Real Força Aérea Australiana passaram por uma modernização da sua capacidade de identificação dos alvos detectados, a qual foi avaliada positivamente em uma campanha de testes. Comentários dos leitores resultaram no texto que se segue, uma comparação com outro vetor de AEW&C, o Embraer E-99M.

As origens do E-7 Wedgetail

 

Atualmente operado pelas Forças Aéreas da Austrália (seis unidades), Coréia do Sul (quatro exemplares), Turquia (também quatro unidades), além de contar com encomendas da Real Força Aérea do Reino Unido (três exemplares confirmados, mais dois opcionais), da Força Aérea norte-americana (26 aeronaves planejadas, duas já contratadas) e da Força de AEW&C da OTAN (seis unidades atualmente sob negociação, que à semelhança do que acontecerá na USAF e na RAF também substituirá o Boeing E-3 Sentry), o Boeing E-7 Wedgetail surgiu em janeiro de 1998, como proposta do consórcio Boeing/Northrop Grumman, que oferecia o Boeing Business Jet (BBJ) equipado com o radar MESA (Multirole Electronic Scan Array) para o Projeto AIR 5077 Wedgetail, nome da maior espécie de ave de rapina da Austrália, lançado em 1994.

Em julho de 1999 a proposta foi anunciada como vencedora e o protótipo Boeing AEW&C (ainda não denominado E-7A ou Wedgetail), com o registro civil N378BC decolou pela primeira vez em 20 de maio de 2004. Estruturalmente, é uma versão do BBJ (que combina a fuselagem do B737-700 com asas reforçadas e trem de pouso do B737-800) com tanques de combustível adicionais no compartimento de bagagem.

O primeiro dos seis E-7A foi aceito no serviço da RAAF em maio de 2010 com o Esquadrão Nº 2 na Base Aérea de Williamtown. O sexto exemplar foi entregue dois anos depois.

Radar MESA: o principal sensor do E-7 Wedgetail

O principal sensor do Wedgetail é o radar Northrop Grumman Multi-Role Electronically Scanned Array (MESA), projetado no final da década de 1980.

É uma antena com quatro aberturas: dois conjuntos laterais fornecendo 120° de cobertura de azimute em cada lado da aeronave, e um conjunto de duas outras antenas à frente e atrás das demais, proporcionando 60° de cobertura de azimute. Ao todo, os conjuntos são compostos por 288 módulos transceptores de carboneto de silício.

O sinal para detecção de alvos é enviado e recebido eletronicamente por cada um dos módulos da estrutura MESA, uma ação que leva apenas alguns milissegundos, diminuindo as chances de um alvo muito rápido ou altamente manobrável escapar da detecção. O MESA também possui recursos de proteção eletrônica, que aproveitam o fato de os sinais de radar serem emitidos em várias direções para cancelar adaptativamente tais emissões, ou seja, de acordo com as características específicas de qualquer interferência eletrônica adversa, garantindo assim a continuidade do funcionamento do sistema.

Cada um dos subconjuntos do E-7 MESA incorpora um dispositivo IFF, utilizado quando a função radar não está ativa.Consequentemente, duas das antenas podem operar como um sensor IFF quando os conjuntos laterais estão transmitindo energia de radar e vice-versa, o que torna sua confiabilidade superior à dos sistemas em que as funções IFF e radar funcionam separadamente. Outros pontos fortes do IFF do E-7, em comparação com um sistema similar instalado a bordo do E-3, são a capacidade de incluir detecções cooperativas de alvos e avaliações situacionais antes que os alvos penetrem na cobertura de vigilância do radar, permitindo que os alvos sejam detectados e localizados antes mesmo que o radar MESA o faça; há melhor detecção em chuva do que radares AEW de frequência mais alta e, finalmente, detecção de longo alcance de alvos menores, como mísseis de cruzeiro. O IFF do MESA tem um alcance superior a 555 km.

Os modos de operação do radar MESA são “Spot” (rastreia alvos de alta prioridade, como bombardeiros, possuindo para tal desempenho de longo alcance aperfeiçoado); “High Pulse Repetition Frequency” (para detecção de alvos aéreos), Low Pulse Repetition Frequency (também conhecido como Modo Marítimo, podendo ser intercalado com vigilância aérea e IFF, permitindo que o radar MESA interrogue um determinado contato sobre sua natureza, se amigável ou não, ao mesmo tempo em que fornece detecções de navios de superfície além do horizonte, mantendo a imagem aérea); Uniform Coverage (fornece uma imagem de ameaça de 360° ao redor do E-7, garantindo que os membros da tripulação do Wedgetail estejam cientes de todas as aeronaves voando em todas as direções); “Dedicated Sector” (quando toda a energia do sensor é concentrada em um local específico de ameaça); “Ground Stabilized Sector” (refere-se a uma determinada posição no solo onde o contato está localizado, mesmo que se mova); “Platform Stabilized Sector” (quando a detecção e o rastreamento estão relacionados à posição voada pelo próprio E-7, não importa a rapidez com que a direção da aeronave mude – durante uma manobra evasiva, por exemplo) e “Track Revisit” (para rastreamentos de alta prioridade, ou seja, alvos realizando manobras em alta velocidade, onde o operador deseja dados adicionais sobre o alvo ou quando o rastreador deseja detecções adicionais, para um alvo que foi temporariamente perdido).

Os modos operacionais podem ser alternados durante um único período de varredura, entre três e 40 segundos. Um dos pontos fortes do radar MESA é sua capacidade de detectar simultaneamente 3.000 alvos aéreos e navais em um alcance de até 350 km, com esse alcance sendo dobrado quando o modo “Dedicated Sector” é ativado, embora ele possa rastrear apenas 180 desses alvos simultaneamente e gerenciar 24 interceptações aéreas. Essa capacidade significa que o radar MESA pode detectar aeronaves e navios ao mesmo tempo em que direciona caças aliados contra ameaças aéreas inimigas.

O MESA pode estar operacionalmente pronto minutos após a decolagem, começando em 1.524 metros e com operação de potência total a 3.048 metros. Ele oferece vigilância em uma área superior a 880.000 quilômetros quadrados, à razão de mais de 77.000 quilômetros quadrados por segundo para uma varredura típica de 10 segundos.

Os outros sistemas do E-7 Wedgetail

Similarmente a outros modelos de vetores de AEW&C, os E-7 Wedgetail possuem dispositivos para outras funções secundárias, como inteligência eletrônica. Entretanto, como de praxe com vários tipos de aeronaves militares, incluindo modelos de AEW&C, e por vários motivos que vão desde legislação de importação de sistemas de armas às conveniências geopolíticas do momento, as capacidades do E-7 Wedgetail (mesmo aquelas relacionadas ao seu radar MESA) podem ser customizadas de acordo com o cliente. Um exemplo disso é o que ocorreu com os exemplares da Força Aérea da Turquia, que inicialmente havia encomendado equipamento de origem israelense para seus exemplares, mas teve de rever a decisão como consequência do ataque da Unidade S13 das Forças de Defesa de Israel à uma flotilha turca navegando para a Palestina em maio de 2010, o que atrasou a introdução em serviço daqueles aviões, que somente ocorreu após a normalização das relações entre os dois países. Os exemplares da Força Aérea sul-coreana também são modificados em relação aos modelos australianos, possuindo outro datalink.

No que concerne aos E-7 da Força Aérea Real Australiana são equipados com três Medidas de Suporte Eletrônico AN/ALR-2001 Odyssey da BAE Australia/Elta Systems e um sistema completo de autodefesa, com alguns equipamentos específicos, derivados dos requisitos operacionais originais do programa Wedgetail da RAAF. Eles formam um conjunto completo de autodefesa, projetado para detectar, localizar e destruir múltiplas ameaças lançadas contra a aeronave.

Desses sistemas, o AN/ALR-2001 foi projetado para detectar, localizar, classificar e rastrear passivamente emissores de radiofrequência (RF) de superfície e aerotransportados. Os contatos do ESM são exibidos na Estação de Sensores, bem como para o piloto (quando apropriado) e são passados ​​para o sistema de gerenciamento de dados da aeronave, onde são mesclados e exibidos com contatos de outros sensores, o que identifica a ameaça. Os dados ESM também podem ser registrados para análise pós-voo em uma instalação terrestre. Os sistemas de suporte terrestre compreendem a Instalação de Suporte de Software, quatro Instalações Pré/Pós-Voo implantáveis, um Simulador de Missão Operacional e dois Treinadores de Tarefas Parciais.

E-7T da Força Aérea Turca

Já o conjunto de autodefesa compreende o Sistema de Contramedidas Direcionais Infravermelhas (DIRCM) Northrop Grumman AN/AAQ-24(V) Nemesis, quatro Sistemas de Alerta de Aproximação de Mísseis (MAWS) Northrop Grumman AN/AAR-54, quatro Sistemas Distribuidores de Contramedidas (CMDS) BAe Systems AN/ALE-47 e quatro sistemas de alerta a laser Elisra LWS-20.·

O AN/AAQ-24(V) Nemesis pode detectar a pluma de escape do míssil ameaçador usando o AAR-54. O resultado prático dessa operação é que a ameaça do míssil inimigo é neutralizada pelo uso de contramedidas – chaff, flare ou consumíveis eletrônicos – implantadas de acordo com o perfil da ameaça. O AN/AAR-54 MAWS é usado para fornecer identificação, informações de rastreamento de mísseis e sinalização de alvos para sistemas de Contramedidas Infravermelhas Direcionadas (DIRCM). Até seis sensores podem ser utilizados, fornecendo até mesmo cobertura esférica completa.

O AN/ALE-47 CMDS é um equipamento adaptável a ameaças, programável por software, capaz de dispensar chaff, flares e consumíveis de radiofrequência ativa. Já o LWS-20 foi projetado para operações autônomas ou integração em um sistema de alerta multiameaças. A configuração autônoma do LWS-20V-2 compreende quatro sensores, um Analisador de Alerta a Laser (LWA), um painel de controle do sistema e um visor para o piloto. A identificação de ameaças é auxiliada por sua biblioteca de ameaças integrada.

O sistema de comunicação é composto por 10 rádios VHF/UHF Rockwell Collins AN/ARC-210 e 3 rádios HF AN/ARC-220 do mesmo fabricante. A aeronave está equipada com sistemas de enlace de dados padrões Link 11 e Link 16, permitindo a operação em rede com as diversas aeronaves aliadas dentro do campo de batalha.

Ingressando-se na aeronave, a partir do cockpit, há seis displays de voo de tela plana e uma suíte de navegação Rockwell Collins Series 90, além de um monitor tático de 6.25 polegadas para os dois pilotos. No compartimento de missão, há um lavatório à esquerda, seguido de dez estações de trabalho (cada uma com um monitor de 21 polegadas), seis à esquerda e quatro à direita, com o comandante de missão sentando-se perto do cockpit. Na sequência há mais gabinetes de equipamentos, uma galley, área de descanso da tripulação com oito assentos e mais gabinetes de equipamentos.

Os dois turbofans CFM56-7B27A possibilitam que o Wedgetail tenha uma velocidade máxima de 870km/h e velocidade de cruzeiro de 760km/h, teto de serviço de 12.496m e alcance de 6.482km, que pode ser estendido com reabastecimento em voo.

O surgimento do Embraer E-99M

Em 2012, a FAB decidiu modernizar suas cinco aeronaves E-99 AEW&C, recebidas entre 2002 e 2003, em um programa de atualização que inicialmente abrangia os seguintes dispositivos: um sistema ativo de autodefesa com lançadores de chaff/flare acoplados a um RWR (Receptor de Alerta por Radar) completo; um sistema ativo de guerra eletrônica e aumento da capacidade de geração de energia a bordo para os novos sistemas, proporcionada por uma APU maior ou mesmo por uma APU adicional.

No entanto, após análise da EMBRAER, tornou-se evidente que qualquer aumento de equipamentos já representaria excesso de peso em uma aeronave cujo peso máximo (24.000 kg) já excede em 500 kg o peso do EMB-145 padrão. Assim, qualquer peso em novos sistemas teria que ser compensado com a diminuição da capacidade de combustível, item extremamente crítico em uma aeronave cuja razão de existir é justamente o tempo que permanece em voo.

Considerando que o teatro de operações da aeronave seria no espaço aéreo brasileiro ou, no máximo, em outro local onde a superioridade aérea já tivesse sido obtida (o que anularia as ameaças ao E-99M), os sistemas de autodefesa e RWR completo foram descartados, sendo este último trocado por um sistema de Inteligência de Sinais (SIGINT) com algumas funções de RWR, cujo tipo e capacidades exatos ainda são desconhecidos, apenas sabendo-se que é fabricado pela empresa israelense Elbit, da qual a AEROELETRÔNICA, sediada em Porto Alegre, é subsidiária.

Outro item descartado, considerando também que a nova aeronave operaria dentro das fronteiras brasileiras, foi a incorporação de um receptáculo para reabastecimento em voo, o que aumentaria não apenas os custos da modernização (incluindo a campanha de testes da nova capacidade), mas também os relacionados à manutenção e ao treinamento das tripulações, embora a sua ausência impactasse na capacidade da aeronave em manter-se em missão por mais tempo – característica crítica no perfil operacional de qualquer vetor de AEW&C – caso fosse necessário, implicando no acionamento de outro E-99.

Para tanto, em dezembro de 2012, foi assinado um contrato com a EMBRAER com duração prevista de cinco anos, que abrangeu não apenas a modernização dos sensores aerotransportados, mas também o treinamento de pessoal e a preparação/atualização da documentação técnica. Outros contratos seriam assinados com a SAAB AB Electronic Defense Systems, fabricante do radar PSR-890 Erieye; com a AEROELETRONICA INTERNATIONAL LTD (para o fornecimento de cinco sistemas SIGINT) e também com a ROHDE&SCHWARZ, fabricante dos novos equipamentos de comunicação do E-99M.

Embora as datas de vencimento dos contratos subsequentes ao firmado com a Embraer tivessem determinado o fim do programa para 2017, situações como restrições orçamentárias e até mesmo a necessidade de ter pelo menos duas aeronaves modificadas como versão provisória do E-99M (para atuar durante a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, com apenas um E-99, o “FAB 6702” tendo sido liberado para uso, incorporando algumas características do futuro modelo modernizado) também contribuíram para o prazo máximo anterior para a conclusão do programa como um todo, segundo semestre de 2022.

Os novos equipamentos do E-99

Embraer E-99M

Detalhando os novos equipamentos incorporados ao E-99M em alguma medida, destaca-se o radar Erieye ER, uma evolução do radar PS-890 Erieye, que teve o Arsenieto de Gálio substituído por Nitreto de Gálio na composição de seus 192 Módulos transmissores/receptores. Juntamente com técnicas avançadas de processamento de sinais, o novo Erieye expandiu sua capacidade de detectar veículos terrestres, bem como alvos aéreos de todos os tipos (incluindo aqueles classificados como “ativos de baixa visibilidade”, Veículos Aéreos Não Tripulados e mísseis de cruzeiro em diferentes altitudes e velocidades, embarcações de todos os tamanhos, até mesmo um barco inflável ou um pequeno periscópio submarino).

É oficialmente aceito que a nova versão apresenta um aumento de 70% no alcance do radar original, daí a sigla ER, “Extended Range” (Alcance Estendido). Considerando que o modelo Erieye anterior possui um alcance instrumentado de 450 km e um alcance máximo de 509 km, um cálculo simples resulta em que o Erieye ER possui um alcance de 765 km e 865 km em ambas as condições, respectivamente.

Em relação aos modos operacionais, o novo radar apresenta os seguintes modos: Modo Indicador de Alvos Terrestres em Movimento; Marítimo; Alerta Antecipado Estendido; Rastreamento e Varredura; Aéreo; Agilidade de Frequência; Exibição de Seção Transversal do Radar; Busca Estabilizada no Solo; Busca Estabilizada na Plataforma. Em termos de um possível aumento na capacidade de detecção simultânea de alvos ainda não há nada oficialmente confirmado; no entanto, é muito provável que seja bem superior aos 300 alvos detectados pelo E-99 antes da modernização e, possivelmente, alcance os mil alvos detectados pelo radar Erieye instalado no EMB-145H da Força Aérea Grega.

Cobertura do Erieye. A versão ER tem alcance ainda maior

Já foi divulgado que os rádios utilizados em cada E-99 básico – cinco Rohde & Schwarz SECOS 400U, complementados por 3 controles remotos GB406S1 – foram substituídos no E-99M por modelos Soveron do mesmo fabricante, mas dentro da filosofia de Rádio Definido por Software, que oferece níveis superiores de atualização e vida útil em comparação aos modelos tradicionais, bem como a capacidade de sintonizar qualquer faixa de frequência.

Outro requisito operacional para o E-99M inclui a incorporação de um novo sistema de Identificação de Amigo ou Inimigo (IFF). Assim, de acordo com notícias amplamente divulgadas pela mídia especializada, o E-99M conta com o dispositivo Thales TSC 2030 como equipamento IFF, que opera na faixa de frequência de 1090 +/-0,5 MHz e nos modos 1, 2, 3/A, C, S nível 3, 4 Criptografado e 5 nível 2, podendo ser operado em temperaturas entre -40°C e +71°C e até pouco mais de 21.000m de altitude.

O novo equipamento de missão do E-99M é operado por cinco especialistas (o E-99 era operado por três), o que diminuiu a carga de trabalho e aumentou a eficiência operacional, impactando positivamente na sua capacidade de vetoração de aeronaves contra os alvos detectados. Agora os consoles de missão estão instalados perpendicularmente à fuselagem, como nos EMB-145H e não mais paralelamente como nos E-99 originais.

Seus dois motores turbofan Allison 3007A1P permitem um alcance pouco maior que 2.600km, com teto operacional de 7.620m. A autonomia de voo é de cerca de 8 horas. Lembrando que os dados podem variar com o perfil da missão.

O primeiro exemplar modernizado foi entregue à FAB em dezembro de 2020, com o quinto e último tendo sido repassado à Força em novembro de 2023.

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