Versão encurtada do primeiro 747 foi desenvolvida para realizar voos de longa distancia; atualmente é apreciado como avião particular de reis
O Boeing 747 trouxe para aviação um novo parâmetro com capacidade e desempenho impressionantes na época de seu lançamento, em 1969, e que até hoje é referência no campo dos grandes aviões comerciais. Mas também eram tempos vorazes e as companhias aéreas buscavam meios de cobrir distâncias cada vez maiores com cada vez mais passageiros.
A primeira geração do Jumbo, o 747-100, tinha alcance de 9.800 km e uma capacidade média para 360 passageiros. Era um gigante capaz de ligar continentes voando a velocidade máxima de 955 km/h. Foi sucesso imediato e empresas do mundo todo compraram o avião da Boeing, que era então o maior do mundo, com 70,6 metros de comprimento.
No entanto, duas companhias em especial desejavam um aparelho capaz de ir ainda mais longe e com uma grande quantidade de passageiros. A Pan Am e a Iran Air requisitaram à Boeing, em 1973, uma aeronave capaz de cobrir duas vezes o alcance do 747 recém-lançado.
A Boeing já contava desde 1971 com o 747-200, uma versão do Jumbo com alcance estendido que podia voar por até 12.500 km, e já trabalhava no 747-300, que estrou em 1980 com uma configuração de cabine que podia transportar até 660 passageiros. Nenhum desses modelos, porém, tinham a autonomia que a Pan Am e a Iran Air desejavam.
A solução foi voltar às pranchetas e criar algo novo. Como o desenvolvimento de um avião é uma das tarefas mais caras e complexas da engenharia, com testes que duram anos, a Boeing decidiu por trabalhar em uma versão super eficiente do 747.
Regime e plástica
A principal forma de reduzir o consumo de combustível de um veículo é diminuindo seu peso. O Jumbo teve de enfrentar uma rigorosa “dieta”, onde perdeu quase 30 toneladas e teve 16 metros de seus comprimento ceifado, chegando a 56,3 metros.
Após essas mudanças, o avião que surgiu foi chamado de 747 SP (Special Performance). Era a cara do Jumbo, mas com algumas diferenças notáveis, a começar, obviamente, pelo tamanho, mas com aspecto “rechonchudo”. Esse efeito é causado pelo leme traseiro, que foi significativamente ampliado para compensar o corte na fuselagem, fazendo deste o mais alto dos 747 até hoje, com 20 metros de altura. Além disso, esse modelo também tem a tradicional “corcunda”, onde fica o segundo andar da aeronave, bem menor.
A maioria dos 747 SP foram configurados com cabines com classe econômica, executiva e primeira classe, e podiam transportar 233 passageiros. A Boeing ainda oferecia arranjos de assentos para 315 ou até 400 ocupantes, mas nenhuma companhia adotou essas opções.
O primeiro voo do 747 SP aconteceu em quatro de julho de 1975 e de imediato a aeronave se mostrou uma esmagadora de recordes. A autonomia do “Baby Jumbo”, como foi apelidado pela imprensa nos EUA, não atingiu o requisito da Pan Am e Iran Air, que buscavam algo próximo de 16.000 km, mas satisfez as empresas com uma autonomia de 12.320 km, um número que também era novidade na época.
Completado os testes e certificações, o que foi realizado em apenas um ano, o 747 SP foi liberado para as primeiras entregas em 1976. Os primeiros grandes clientes do “baby” foram a Iran Air, que comprou quatro unidades, a South African Airway, com cinco exemplares, e a Pan Am, que levou logo 11 aeronaves. Outras companhias que também compraram o Boeing 747 SP logo após sua estreia foram a Syrianair e China Airlines.
Com uma capacidade para carregar incríveis 196.600 kg de combustível, 13,2 mil a mais que o 747-100, a versão SP ficou especializada em voos transcontinentais e aumentou a frequência de viagens sem escalas para os EUA partindo de países da Ásia, Oriente Médio e África. Essas operações até então eram realizadas com jatos antigos, como o Boeing 707 e o Douglas DC-8, que exigiam paradas para reabastecimento.
Esmagador de recordes
O 747 SP foi pioneiro em uma série de voos regulares de longa distância com destino a Nova York partindo de cidades como Teerã, Tóquio, Johanesburgo e Buenos Aires. Com essa enorme performance, o ‘Jumbinho’ realizou alguns feitos interessantes.
Em 1976, no ano em que estrou, um 747 SP da Pan Am deu a volta ao mundo com apenas duas paradas. A aeronave decolou de Nova York, pousou em Nova Delhi, na Índia, e em seguida em Tóquio para enfim retornar ao ponto de origem. A viagem durou 46 horas e 26 minutos e cobriu uma distância de 37 mil quilômetros.
Outro feito famoso do Baby Jumbo foi durante as celebrações dos 50 anos da Pan Am, com o “Pan Am Flight 50”, em 28 de outubro de 1977. O jato decolou de São Frascisco, nos EUA, e passou por Londres, Cidade do Cabo e Auckland, na Austrália, completando uma volta ao globo voando sobre os polos sul e norte em 35 horas e 54 minutos.
Rota do Apartheid
Devido ao antigo regime de segregação racial da África do Sul, os aviões da South African Airways eram proibidos de pousarem em uma série de países. A retaliação internacional impedia que as aeronaves realizassem paradas de reabastecimento no longo caminho até os EUA, onde tinham permissão para pousar.
No anos 1970, o único avião capaz de ligar Johanesburgo aos EUA com um voo direto era o Boeing 747 SP. Em 1973, a companhia estabeleceu a incrível rota diária entre a capital da África do Sul e Nova York, um voo de quase 13 mil km e cerca de 17 horas de duração que levava o mini-Jumbo ao limite de sua autonomia.
A companhia sul-africana operou seis jatos 747 SP entre 1976 e 2003 e a maioria sempre voou para os EUA. Com o fim dos embargos relacionados após a queda do Apartheid, a South African também levou seus Jumbos de alta performance para a Europa e Ásia.
Rotas do Tango
Dois jatos 747 SP também foram operados pela companhia Aerolineas Argentinas em seu auge. Os modelos foram empregados entre 1979 e 1985 em algumas das maiores rotas que a empresa já realizou. Partindo de Buenos Aires, os Jumbos de alta performance voavam sem escalas para cidades como Melbourne, na Austrália, Auckland, na Nova Zelândia, e Nova York, o destino mais frequentado pelo aparelho.
A United Airlines, que também operou os 747 SP, voou dos EUA para São Paulo e o Rio de Janeiro durante um curto perído na década de 1990 até substitui-los pelos 747-400.
Produção limitada
Por ser um jato com um propósito muito específico, o Boeing 747 SP não chegou a ser um estouro de vendas, como foi o primeiro Jumbo ou as séries seguintes, todas com mais de uma centena de exemplares construídos. O modelo de alta performance, em contrapartida, teve apenas 45 unidades fabricadas.
Nos sete primeiros anos em que foi fabricado, a Boeing entregou 44 unidades do jato. A próxima unidade seria vendida apenas sete anos depois. O último modelo, com cabine executiva, foi encomendado pelo governo de Abu Dhabi em 1987 e concluído dois anos depois. Sem mais nenhum pedido, a empresa americana encerrou a produção do 747 SP em 1989.
Apesar de raros, as poucas unidades do Baby Jumbo foram muito disputadas. Ao todo, as aeronaves passaram por 38 companhias aéreas, especialmente empresas da Ásia e África.
Babys remanescentes
Com o aumento do preço do combustível e a elevação nos custos de operação do 747 SP, que ainda possuem antiquados motores turborreatores, o avião foi perdendo aos poucos as suas vantagens até se tornar caro demais para ser utilizado em voos comerciais.
De todos os 45 modelos fabricados em 14 anos, apenas um continua a serviço por uma empresa aérea. A Iran Air ainda mantém um 747 SP em operação, um dos primeiros exemplares construídos e que está na frota da companhia iraniana desde 1973.
Com a desativação dos aparelhos das rotas comerciais, o mini-Jumbo caiu nas graças de executivos e chefes de estados, principalmente no Oriente Médio. A Arábia Saudita, por exemplo, possui três aparelhos com cabine executiva disponível para transportar membros do governo e da coroa. Os governantes do Qatar, Barein e Omã também voam de 747 SP.
Na América do Norte, os 747 SP remanescentes também foram convertidos em jatos executivos, como os dois aparelhos comprados pelo grupo de casinos Las Vegas Sands. Já outros dois modelos ganharam funções ainda mais nobres: a Nasa equipou um desses Jumbos com um telescópio aéreo e a fabricante canadense Pratt & Whitney adquiriu o seu para usá-lo como plataforma de testes de novos motores em voo.
O 747 SP nunca caiu. Os maiores sustos com a aeronave foram dois pousos de emergência, um realizado pela China Airlines, em 1985, e outro pela LAM Mozambique Airlines, em 1998. Em nenhum desses incidentes houve mortos ou pessoas gravemente feridas. Com um número tão pequeno de incidentes, o mini-Jumbo é uma das aeronaves mais seguras já fabricadas.
Dos 45 jatos construídos, 19 deles já foram desmontados e um foi preservado pela Boeing. Outros oito aparelhos, ainda em condições de voo, estão estocados esperando por um novo operador ou então interessados em suas peças.
Dono de uma carreira repleta de grandes realizações, o 747 SP sucumbiu ao rápido avanço da aviação, que encontrou novas formas de ir mais longe, com mais passageiros e gastando menos combustível. O 747-800, a versão mais moderna do Jumbo, que o diga: esse sim era o avião que as companhias desejavam nos anos 1970. Mas ele só existe hoje…
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