Projetos muito inovadores, visão equivocada de mercado, custos elevados e pressões políticas marcaram o fim de muitos aviões
Projetos muito inovadores, visão equivocada de mercado, custos elevados e políticas de bastidores condenaram muitos aviões. Nesta segunda parte elencamos os aviões que jamais tiveram um lugar ao sol.
Embora os britânicos tenham a primazia do primeiro avião comercial a jato, os canadenses realizaram o voo inaugural do Avro Canada C102 Jetliner em 10 de agosto de 1949, apenas três dias depois do de Havilland Comet. Assim como seu rival do outro lado do Atlântico o pioneirismo cobrou o seu preço. Mesmo considerado adequado para uma série de rotas domésticas nos Estados Unidos, que já era o principal mercado de aviação comercial no mundo, o Jetliner enfrentou uma série de erros. O sinal de que algo estava indo mal no projeto ocorreu antes mesmo do primeiro voo. Pneus estourados por falha do sistema de freios anti-skid, que não permite o travamento das rodas, fizeram os canadenses perder a primazia do voo inaugural do avião comercial a jato para os ingleses. Além de iniciar os testes de alta velocidade no solo sem o sistema anti-skid, as autoridades canadenses haviam liberado uma pista de teste mais curta do que o planejado, o que atrasou os ensaios e levou a estouros de pneus. No dia 16 de agosto, logo após o segundo voo, uma falha no trem de pouso obrigou um pouso de barriga. Novos atrasos e pressões ocultas levaram o governo do Canadá a cancelar o projeto em 1951 e sucatear o único protótipo. Ironicamente, o excêntrico bilionário Howard Hughes propôs construir o Jetliner em série nos Estados Unidos.
O C102 Jetliner foi o prelúdio de uma era de inovações e políticas de bastidores no Canadá. O país, que se notabilizou por uma indústria aeronáutica de ponta, logo descobriu que o projeto de um avião vai além das qualidades de engenharia e o caça supersônico CF-105 Arrow, da Avro Canada, é o maior exemplo dessa verdade.
Após o bem-sucedido CF-100 Canuck mostrar a capacidade da Avro Canada em desenvolver e construir aviões a jato, os engenheiros deram um passo além. De forma bastante audaciosa o Canadá anunciou em meados de 1955 que estava trabalhando em um interceptador capaz de voar Mach 2 (aproximadamente 2.470 km/h) e atingir 50.000 pés em poucos minudos.
O primeiro voo ocorreu em março de 1958, e logo o avião mostrou suas boas capacidades e um projeto acertado, superando Mach 1.9. Ao longo de onze meses o avião evoluiu acima das expectativas, mas em fevereiro de 1949 uma ordem do primeiro-ministro do Canadá John Diefenbaker interrompeu o desenvolvimento dos motores do caça. Em dois meses autoridades e forças militares garantiram que a linha de produção, ferramental, projetos e os aviões existentes fossem completamente destruídos. Ainda hoje o tema é controverso.
A Alemanha Oriental não se destacou por sua indústria ou capacidades, que estavam sob intenso controle de Moscou. Ainda assim, em meados dos anos 1950 a VEB Flugzeugwerke Dresden passou a trabalhar no projeto de um avião comercial a jato. Derivado de um programa de bombardeiro cancelado pelos soviéticos, o Baade 152, também chamado de Dresden 152 ou VL-DDR 152, previa um quadrimotor, com motores montados em duplas em cada asa, com capacidade entre 48 e 72 assentos e alcance de aproximadamente 2.000 km. O primeiro voo ocorreu em dezembro de 1958, com dois protótipos dedicados a campanha de ensaios em voo. Em março do ano seguinte um dos protótipos caiu, matando todos a bordo. Embora tivesse um desempenho razoável, um problema grave no sistema de abastecimento de combustível foi a desculpa para cancelar o projeto em 1961. Os aviões que estavam na linha de produção foram destruídos e o avião jamais entrou em serviço ativo.
Alguns aviões sofrem por chegar muito cedo ou muito tarde ao mercado. Os britânicos colecionam inúmeros exemplos de projetos que estavam fora de sintonia com o que operadores desejavam ou que a tecnologia podia oferecer. O Bristol Type 175 Britannia foi desenvolvido como um turboélice comercial para até 140 assentos, com alcance de 7.100 km. Lançado no início dos anos 1950 o Britannia prometia não apenas revolucionar o transporte aéreo, mas especialmente ser capaz de impedir o crescimento da Douglas, Lockheed e Boeing no mercado europeu. O primeiro voo ocorreu em agosto de 1952 e assim como o Comet, que sofria com problemas técnicos, o Britannia passou a enfrentar graves problemas com a formação de gelo na entrada dos motores. Dois protótipos foram perdidos em acidentes e quando o avião entrou em serviço, em fevereiro de 1957, os jatos eram uma realidade. Apenas 85 aviões foram construídos e a Boeing e a Douglas já lideravam as vendas de jatos ao redor do mundo.
A união das capacidades de engenharia aeronáuticas da Alemanha Ocidental e da Holanda prometia unir o melhor de dois mundos. Ao mesmo tempo, a frota de aviões comerciais oriundos do excesso de Guerra estava praticamente toda aposentada. Rotas regionais, para até 45 assentos, mostravam bom potencial de mercado. Assim a alemã Vereinigte Flugtechnische Werke (VFW) e a holandesa Fokker se uniram para criar um avião regional a jato revolucionário, o VFW-Fokker 614. O avião chama atenção por seus motores montados sobre as asas, cabine com bom espaço interior e baixo ruído. Mas interesses diversos entre as duas empresas não ajudaram nas vendas. A Fokker estava preocupada em promover sua própria linha de jatos regionais, os alemães ainda reestruturando sua indústria aeronáutica que havia sido desmantelada no pós-guerra. O primeiro voo do VFW-614 ocorreu em julho de 1971, mas o programa foi cancelado, em 1977, após 19 aeronaves produzidas.
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