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sábado, 17 de agosto de 2024

Defesa aérea do Japão

 

F-4EJ #1Um dos grandes debates da estratégia militar é referente ao ponto onde a defesa termina e o ataque começa. Uma nação declaradamente pacífica, mas que teme ser atacada pode antecipar-se e tomar a ofensiva?

No Japão, o pacifismo está consagrado na constituição em vigor desde 1947: esta contém a renúncia à guerra enquanto direito soberano. As Forças Armadas japonesas, reorganizadas depois da Segunda Guerra Mundial, levam o qualificativo “de Autodefesa”. No entanto, o País do Sol Nascente, durante a Guerra Fria (e atual) estava numa das fronteiras da esfera de influência político-militar norte-americana; a União Soviética era sua vizinha. Se de um lado os Estados Unidos tentavam proteger sua economia da concorrência japonesa, de outro eles procuravam convencer o governo de Tóquio a gastar mais com suas forças navais e aéreas.

A União Soviética tinha tantos recursos bélicos no Extremo Oriente quanto na Europa. Em parte, isso se devia às relações cada vez mais amistosas da República Popular da China com os Estados Unidos, os países da Europa Ocidental e o Japão. Na região do porto de Vladivostok, na ilha de Sacalina e na península de Kamchatka havia mais de 2 200 aeronaves de combate, entre elas quinhentas da Aviação Naval (Aviatsiya Voyenno-Morskoi Flot, ou AV-MF). Ali estavam aviões modernos, como os bombardeiros Tupolev Tu-26 “Backfire” e os interceptadores Mikoyan-Gurevitch MiG-31 “Foxhound”. A Frota do Pacífico possuía dois ou três porta-aviões da classe “Kiev”, além de duzentos vasos de superfície e 134 submarinos, entre eles 24 de propulsão nuclear e dotada de mísseis balísticos (chamados pelo código SSBN pela Marinha dos EUA).

O principal caça da Força Aérea de Autodefesa do Japão é o McDonnell Douglas F-15J Eagle, feito pela Mitsubishi sob licença, com aviônicos locais, entre eles o sistema de contramedidas eletrônicas e o radar de alerta.

Em abril de 1985 essa frota soviética realizou um exercício englobando manobras simultâneas no norte, até o golfo do Alasca, no sul, até o mar das Filipinas, e na parte oriental do mar da China, além de no mar do Japão. Foram simulados ataques contra barcos mercantes e contra grupos de navios capitaneados por porta-aviões.

Se os ataques tivessem sido reais, Japão e Estados Unidos teriam fracassado em seu objetivo principal, isto é, a contenção da frota soviética no mar do Japão. Só existem três estreitas passagens desse mar para a massa principal do Pacífico, e nenhuma delas era controlada pela União Soviética. O estreito de Soya (ou La Perouse) é a fronteira entre a ilha japonesa de Hokkaido e a soviética de Sacalina; o estreito de Tsugaru separa Hokkaido de Honshu, a principal ilha japonesa; o estreito da Coréia fica entre a península Coreana e o sudoeste do Japão. Os soviéticos tinham que necessariamente usar essas passagens, porque a maior parte de sua esquadra tinha base na região de Vladivostok, único porto de águas quentes do país no Extremo Oriente. Mais ao norte, o mar de Okhotsk e o mar de Bering banham costas que ficam cobertas de gelo por muitos meses, embora existisse uma base de SSBN no sul da península de Kamchatka.

A Força Aérea dos EUA mantinha a 432ª Ala de Caças Táticos em Misawa, no norte da ilha de Honshu. Os aviões dessa unidade eram General Dynamics F-16A Fighting Falcon. A intenção manifesta dos norte-americanos era proteger seu aliado, o Japão, de uma possível agressão por parte da URSS.
A Força Aérea dos EUA mantinha a 432ª Ala de Caças Táticos em Misawa, no norte da ilha de Honshu. Os aviões dessa unidade eram General Dynamics F-16A Fighting Falcon. A intenção manifesta dos norte-americanos era proteger seu aliado, o Japão, de uma possível agressão por parte da URSS.

Vigilância constante

Na eventualidade de um conflito, os radares japoneses e o posto de escuta norte-americano em Wakkanai, no norte de Hokkaido, seriam logo visados pelos soviéticos. Depois que um avião comercial coreano foi abatido sobre a ilha de Sacalina (a apenas 80 km do território japonês) em 1º de setembro de 1983, por interceptadores Sukhoi Su-15, um destacamento de bombardeiros MiG-31 foi mandado para a base de Dolinsk, na ilha.

Forças do exército soviético estacionadas no sul do arquipélago das Kurilas podiam atingir o norte da ilha de Hokkaido com fogo de artilharia. Quando o Japão assinou um tratado de amizade com a China em 1978, a União Soviética postou uma divisão do exército nas Kurilas, o que não fazia desde 1950. Depois chegou também uma divisão de caças-bombardeiros MiG-23 à base aérea de Burevestnik, na ilha de Iturup. Uma divisão de infantaria naval baseada nas redondezas de Vladivostok, com 7 000 homens, poderia facilmente fazer um desembarque anfíbio no litoral japonês, contando com o apoio de um regimento de aviões Sukhoi Su-17 da AVMF destacado para a região.

Por seu turno, a Força Terrestre Japonesa de Autodefesa conservava seu Exército do Norte em Hokkaido como a mais forte de suas cinco formações. As quatro divisões desse Exército eram apoiadas por helicópteros Fuji (Bell) UH-1B/H e Kawasaki (Boeing-Vertol) KV-107, para transporte de tropas; reforçados por setenta Fuji (Bell) AH-1S equipados com mísseis antitanque rastreados opticamente e guiados por fio (as forças soviéticas, do outro lado, tinham grande quantidade de helicópteros Mil Mi-24). Para substituir os KV-107, foi selecionado o Boeing-Vertol CH-47C Chinook.

Operados pelo Esquadrão 601 em Misawa, os oito Grumman E-2C Hawkeye da Força Aérea de Autodefesa do Japão executavam missões de alerta aéreo antecipado para a força de interceptação. Esses aviões podiam vir a ter seu alcance aumentado mediante reabastecimento em voo.
Operados pelo Esquadrão 601 em Misawa, os oito Grumman E-2C Hawkeye da Força Aérea de Autodefesa do Japão executavam missões de alerta aéreo antecipado para a força de interceptação. Esses aviões podiam vir a ter seu alcance aumentado mediante reabastecimento em voo.

Os estrategistas se perguntavam se, no caso de a União Soviética mobilizar suas forças para um ataque, o Japão poderia garantir os estreitos atacando primeiro? A maneira mais eficiente de conseguir isso seria por interdição aérea. No entanto, a Força Aérea de Autodefesa do Japão foi organizada para ser somente uma força de interceptação a curta distância. Quando fez a encomenda dos aparelhos McDonnell Douglas F-4EJ Phantom, os japoneses especificaram que o receptáculo para reabastecimento em voo deveria ser retirado dos aviões, reduzindo assim sua capacidade ofensiva.

Aviões-tanque

No entanto, já na época os dirigentes militares japoneses estavam mudando de idéia e pensando seriamente na compra de aviões-cisterna para reabastecer a frota de aviões McDonnell Douglas F-15J Eagle, cada vez maior. Os caças-bombardeiros Mitsubishi F-1 dispunham de um míssil antinavio e previa-se que quando os F-1 fossem desativados na década de 90, entrariam no seu lugar aparelhos ofensivos com autonomia de voo muito superior, da categoria do McDonnell Douglas F/A-18 ou do Panavia Tornado. Na época, porém, a Força Aérea restringia-se à interceptação, com cerca de 130 aviões F-4EJ, além de aparelhos F-15J que deveriam totalizar 190 no final. Os Eagle levavam mísseis AIM-7E Sparrow e AIM-9L Sidewinder, e os F-4EJ seriam atualizados de modo a portar mísseis AIM-7F e AIM-9L. Setenta caças F-1 foram distribuídos em três esquadrões, e um esquadrão de reconhecimento operava catorze RF-4E bem equipados. Doze Grumman E-2C Hawkeye forneciam capacidade de alerta aéreo antecipado, de modo a evitar que se repetissem incidentes como o de setembro de 1976, em que um piloto soviético desertou com seu MiG-25 e pousou em Hokkaido sem ser interceptado. Existia ainda 180 mísseis superfície-ar Nike-J, divididos em seis grupos, que deveriam ser substituídos por Raytheon Patriot.

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Foto em preto e branco mostrando o porta-aviões norte-americano Midway, cuja base era o porto japonês de Yokosuka. Ele estava sendo observado por um avião soviético llyushin 11-38 “May”.
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Em contrapartida, aqui aparece o porta-aviões soviético Minsk sendo sobrevoado, no mar do Japão, por aviões F-15 e RF-4C da Força Aérea dos Estados Unidos.

O Japão contava, assim, com uma boa defesa aérea, e ela podia ser ampliada por três esquadrões de F-15 da Força Aérea dos Estados Unidos (USAF) que compunham a 18º Ala de Caças Táticos (TFW) das Forças Aéreas do Pacífico (PACAF), com base em Kadena, na ilha de Okinawa. Em Misawa, no norte da ilha de Honshu, ficavam dois esquadrões de General Dynamics F-16 que compunham a 432ª Ala de Caças Táticos. Entre os aviões de treinamento estavam aparelhos Lockheed T-33 e Mitsubishi T-2 (aeronave supersônica biplace a partir da qual foi desenvolvido o F-1).

Interceptação freqüente

Mesmo na paz, os esquadrões de interceptação japonesa tinham (tem) muito trabalho — mais do que seus colegas de qualquer país do Ocidente —, pois havia freqüentes violações do espaço aéreo do Japão por parte de aparelhos da Aviação Naval e da Força Aérea Soviética. A principal base da AVMF ficava em Sovetskaya Gavan, no continente, na mesma latitude do sul da ilha de Sacalina. Uma enorme área do Pacífico podia ser coberta por aviões Tupolev Tu-26, Tu-95/142 e Tu-16 vindos de lá e da península de Kamchatka. Os Tu-26 da Força Aérea ficavam em bases muito mais distantes, perto do lago Baikal, na Sibéria ocidental; no entanto, sua autonomia de voo de 5 500 km lhes permitiria operar contra alvos no Japão. No total, os dois ramos citados das Forças Armadas soviéticas tinham cerca de oitenta Tu-26 “Backfire-B” e quarenta Tu-142 “Bear-F” (para guerra anti-submarina) na região, além de 140 aviões mais velhos — Tu-142 “Bear-D”, Tu-16 “Badger” e Tu-22 “Blinder” — para missões de ataque nuclear, reconhecimento estratégico e reabastecimento em voo.

J16Em setembro de 1984 os soviéticos demonstraram a técnica de ataques em ondas, para saturação das defesas terrestres e marítimas: 24 “Backfire” voaram ao largo do litoral japonês, até a latitude de Komatsu, na ilha de Honshu, com cerca de 300 km separando o primeiro e o último par de aviões. Quatro F-1 e dezesseis F-4 levantaram voo para escoltar os bombardeiros soviéticos, que se deslocavam a velocidade subsônica e a altitude média, aparentemente sem armamento.

O Japão depende inteiramente de importações para suprir suas necessidades de petróleo e gás liquefeito, de modo que uma boa defesa das vias navais do sul e do sudeste é importante. Os japoneses prometeram ampliar seu raio de proteção para 1 600 km, o que implicou a compra de mais destróieres, fragatas, aviões de guerra anti-submarina e de cobertura. As forças norte-americanas estavam encarregadas da maior parte desse trabalho. Um esquadrão de Boeing B-52G do Comando Aeroestratégico com base em Guam desempenhava missões lança-minas e antinavio (com mísseis ar-superfície Harpoon). O grupo de combate capitaneado pelo porta-aviões USS Midway tinha sua sede em Yokosuka, perto de Tóquio. Esse navio-aeródromo tinha mais de quarenta anos e era não só o mais velho da frota norte-americana como também o único com base fora dos Estados Unidos. Quatro dos cinco esquadrões de combate da ala aérea do Midway (CVW-5) estavam substituindo seus F-4 e Vought A-7 Corsair por aviões Grumman A-6E Intruder.

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O F-4EJ ao alto era do Esquadrão 304, da Ala 8, que os japoneses mantinham em Tsuiki. Havia mais de 180 desses aparelhos em serviço até serem substituídos em parte por aviões F-15. A Força Aérea de Autodefesa do Japão também empregava aviões RF-4EJ para missões de reconhecimento tático. A outra foto mostra um F-1 do Esquadrão 8, de Misawa. Embora fosse basicamente um avião de apoio aproximado, o F-1 era usado pelos japoneses para interceptar aparelhos de bombardeio da URSS que invadiam o espaço aéreo do Japão.

Três esquadrões de Lockheed P-3C Orion faziam rotação entre bases nos Estados Unidos e Guam, Kadena e Misawa. Até 1982, seis dos esquadrões de patrulha da Força Naval de autodefesa do Japão estavam equipados com aviões Lockheed P-2J Neptune, relativamente lentos e pobres de recursos; o esquadrão restante usava aviões Shin Meiwa PS-1, anfíbios. A partir daquele ano foram entrando em serviço aparelhos Orion para substituir os tipos antigos, e os japoneses planejavam comprar um total de cem desses aviões, o suficiente para reequipar todos os sete esquadrões até 1990. A Marinha também tinha setenta helicópteros Sikorsky HSS-2 Sea King, para guerra anti-submarina, com bases no litoral, embora a versão mais moderna na época, o HSS-2B (produzido pela Mitsubishi), estivesse presente em onze dos trinta destróieres. Havia ainda dezoito fragatas e treze submarinos na frota, e quatro modernos navios de defesa aérea do tipo Aegis foram encomendados.

J15O controle dos mares

A Força Aérea estava fazendo sua parte no esforço da Marinha para estender seu controle sobre os mares, planejando instalar bases de aviões F-15 Eagle em Iwo Jima e comprar pelo menos dez aviões-tanque para aumentar o raio de ação sobre as águas oceânicas. A indústria de defesa do Japão ampliou suas atividades. Todas as novas aeronaves que estavam entrando em serviço eram fabricadas sob licença no país. A Kawasaki produziu o P-3C, o CH-47C e o T-4; a Mitsubishi fez o F-15; a Fuji fabricou o AH-1S. A indústria eletrônica japonesa pelo menos se igualava ao que havia de melhor no Ocidente. Quando a Mitsubishi começou a produzir o Sikorsky Seahawk (SH-60J) para substituir os helicópteros Sea King que a Marinha tinha, instalou sistemas eletrônicos e aviônicos totalmente japoneses.

Os norte-americanos devem ter ficado satisfeitos com os progressos do poderio aéreo de seu principal aliado no Pacífico, ainda mais levando em conta que, para consegui-los, o governo japonês teve que enfrentar forte resistência de movimentos pacifistas. Os Estados Unidos contavam com valiosas bases em território japonês, especialmente na ilha de Okinawa, onde uma divisão completa do Corpo de Fuzileiros Navais tinha sua sede permanente. A Ala Aérea dos Fuzileiros, que operava em conjunto com aquela divisão, tinha seus aviões distribuídos entre Okinawa e Iwakuni, na ilha de Honshu, a sudoeste de Hiroshima. Kadena, em Okinawa, onde ficavam os aparelhos estratégicos norte-americanos, como os aviões-tanque KC-135 Stratotanker e os aparelhos de espionagem Lockheed SR-71 Blackbird.

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