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domingo, 26 de fevereiro de 2023

Pai de aviões usados pela Alemanha nazista criou caças na Argentina e Egito

 FW 190

FW 190 e o BF 109 foram dois dos principais caças da força aérea nazista na II Guerra Mundial | Foto: Museu Nacional da Força Aérea dos Estados Unidos 

O que um renomado engenheiro aeronáutico alemão tem a ver com a história da indústria aeronáutica argentina, indiana e egípcia? Para entendermos essa interessante história temos que voltar à época da 2º Guerra Mundial, mas especificamente ao lendário Kurt Tank.

FW 190

Caça FW 109 acumulou mais de 20 mil unidades produzidas durante anos da guerra mundial | Foto: Museu Imperial de Guerra 

O caça FW 109, juntamente com outro icônico avião o Messerchmitt BF-109, faziam frente aos melhores caças aliados da época como o inglês Spitfire e o norte-americano P-51 Mustang. 

O sucesso nos projetos de Tank o consagraram como um dos grandes projetistas aeronáuticos de todos os tempos. Suas criações ultrapassaram o tempo da guerra e chegaram em outros continentes. É o caso do avião FW 200, um avião comercial que chegou a ser operado pela empresa brasileira Sindicato Condor (então subsidiária da alemã Luft Hansa) e que posteriormente seria batizada de Cruzeiro do Sul.

O FW 200 ainda serviu como avião de reconhecimento marítimo armado, com notável desempenho nas missões de bombardeio. Além disso, foi o avião usado por Hitler em seus deslocamentos pela Alemanha e diversos territórios conquistado pelos nazistas durante a Segunda Guerra.

Projeto em terras argentinas

Com o fim da guerra e a derrota dos nazistas, a Alemanha ficou proibida de desenvolver novos projetos de aviões e outros equipamentos bélicos por 15 anos. Com isso, Kurt Tank e sua equipe da Focke-Wulf tiveram que sair do país em busca de trabalhos na área aeronáutica. Mesmo tendo desenvolvido aviões usados pela força aérea alemã durante a Guerra, Tank e sua equipe não tinham vinculos com o partido nazista.

Quando chegou à Argentina, no final da década de 1940, o país liderado por Juan Domingo Perón já contava com uma considerável história aeronáutica, e detinha a Fabrica Nacional de Aviones (que projetou dois aviões de produção local, o Ae. C1 e Ar. C2). A iniciativa tornava a Argentina um dos primeiros país do mundo a ter capacidade de desenvolver e produzir localmente aeronaves a jato, ao mesmo tempo que nações como os Estados Unidos, Inglaterra, França e União Soviética. 

Kurt Tank chegou ao país sul-americano para trabalhar à serviço do governo de Perón. Logo o renomado engenheiro alemão projetou o IA-33 Pulqui II, um projeto de um caça a jato, que superava os 1.000 km/h e era baseado no Ta.188 (também de criação de Tank).

Como comparação, em 1950 o Brasil estava prestes a recebe sua primeira fábrica de automóveis, que seria subsidiária da também alemã Volkswagen. 

IA-Pulqui II

Desenho do IA- Pulqui II tem algumas semelhanças com o jato soviético MiG-15,usado na Guerra da Coreia | Foto: Via Internet

O diferencial do Pulqui II eram suas asas em enflechadas, mas os primeiros protótipos apresentavam alguns problemas e um acidente causou a morte de um piloto de testes. Então, Tank teve que reformular o projeto e sanar algumas falhas conceituais, que eram o grande desafio dos aviões a jato e com asas enflechadas.

O Pulqui II foi apresentado pela primeira no Aeroporto Jorge Newberry, na capital Buenos Aires. O sucesso do avião foi tanto que o Egito (que vamos ver daqui a pouco), Holanda e a própria Argentina se interessaram pelo avião.

IA Pulqui II de frente

Característica principal da aeronave projetada por Tank eram suas asas em flecha e a entrada de ar do motor | Foto: Internet

Entretanto, por intermédio do presidente Perón, foi ordenado que a Fabrica Militar de Aviones (FMA) concentrasse projetos na construção de carros e caminhões. Havia a pressão norte-americana para a Argentina optar por seus caças, em detrimento de sua indústria aeronáutica nacional.

Tal ação culminou com o quase fechamento do setor aeronáutico da FMA. Com a mudança na presidência do país o contrato de Kurt Tank expirou e o renomado projetista pegou como proa a Ásia, mais especificamente a Índia.  

Projeto do primeiro caça indiano, o HF-24 Marut

A Hindustan Aeronautics Limited (HAL) já conhecia os ótimos projetos de Tank e o convidou para ajudar no desenvolvimento do que viria a ser o primeiro caça produzido em território indiano.

Diferente do jato argentino, o HF-24 entrou em fase de produção em série e chegou a entrar em serviço pela força aérea indiana.

HAL HF-24

HAL HF-24 Maruter ficaram operacionais até a década de 1980 | Foto: Via Internet

Quando projetado, o avião deveria ser um interceptador que pudesse alcançar velocidades de Mach 1, superando assim a velocidade do som. Contudo, problemas nos motores e outros ligados a fatores políticos e econômicos a trabalharam bastante o desenvolvimento do avião.

Todavia, o HF-24 Marut chegou a entrar em combate real, na Guerra Indo-Paquistanesa (1971), onde cumpriu missões de ataque ar-solo. O Marut ficou na ativa na IAF até a década de 1980, quando já estavam bem obsoletos e sem capacidade de modernização. Mesmo assim, o HF-24 teve um importante papel no desenvolvimento da indústria aeronáutica indiana

Ousado projeto egípcio (que quase deu muito certo)

A última parte de nossa história acontece no Egito, país norte-africano conhecido por sua história milenar entre pirâmides, medicina, arquitetura e matemática.

Mas, para falarmos deste projeto egípcio, precisamos ir à Espanha e relatar alguns fatos de outro grande projetista alemão da Segunda Guerra Mundial, o Willy Messerschmit outra lenda alemã, responsável pelo desenvolvimento do BF 109 e do primeiro jato operacional Me 262.

Após o fim da guerra, Mersserchmit foi trabalhar na indústria Hispânica de Aviação e ajudou a projetar três aviões, sendo um à pistão, outro à reação e um jato de alta performance.

Caça HA-300

Desempenho do HA-300 era muito bom, graças ao pouco peso do caça somado a potência do motor | Foto:Via Internet

Os dois primeiros projetos receberam os nome de HA-100 e HA-200. A segunda aeronave chamou a atenção do governo do Egito, que pediu a construção sob licença do HA-200 em território egípcio.

Bem como também, solicitou participação no desenvolvimento do terceiro e mais ousado projeto, o HA-300.

Entretanto, o recebimento que caças norte-americanos F-86 Sabre pela Espanha fez o governo desistir dos projetos locais e o Egito deu continuidade sozinho ao HA-300.

Desenvolvimento

Mersserchmit e sua equipe foram transferidos para a instalação da base aérea de Helwan, a sul da capital Cairo. Lá os engenheiros começaram o desenvolvimento de um caça leve que pudesse alcançar velocidades de Mach 2 (aproximadamente 2.400 km/h).

Todavia, para levar o HA-300 a Mach 2 e voar a altitude de 12 mil metros era preciso um bom motor, por isso foi escolhido britânico Bristol-Siddeley Orpheus 703.

A escolha foi acertada, pois o empuxo, aliado ao baixo peso da aeronave fazia com que a performance do caça egípcio tivesse velocidades equivalentes ao francês Mirage III, já considerado um dos melhores caças da época (que inclusive adquirido pelo Brasil, em 1972).

HA-300 do Egito

Asas em delta do avião ajuda a proporcionar maiores velocidades | Foto: Via Internet

Novamente havia um porém, e a Bristol desistiu do projeto e deixou o HA-300 sem uma eficiente motor capaz de proporcionar características de voo ideais. Uma das especulações é que havia forte pressão francesa e mesmo inglesa para o Egito não dispor de uma aeronave com capacidades próximas ao Mirage III.

O Egito queria de fato o desenvolvimento do avião e para isso foi decidido que seria produzido um motor localmente, mas para ajudar nesta complicada façanha Messerschmitt chamou seu amigo Kurt Tank para mais essa missão. Agora o objetivo era encontrar um engenheiro com conhecimento para formar uma equipe e liderar o desenvolvimento de um motor supersônico.

Projetar motores é bastante complicado, ainda mais sem nenhuma experiência. Foi então que os renomados engenheiros chamaram Ferdinand Brander, um famoso engenheiro austríaco especialista na fabricação de motores.

Motor Brandner E-300

Motor Brandner E-300 porporcionva uma considerável potência ao HA-300 | Foto: Via Internet

Brander veio com a proposta do motor E-300 que desenvolvia 4000 quilogramas-força, algo de bastante relevância para o caça HA-300.

O primeiro voo

A Índia se interessou pelo projeto do Cairo, talvez pelo fato de Tank estar presente no desenvolvimento. Então conversas foram feitas e ambos os países definiram que os indianos iriam financiar a fabricação do motor E-300. E o Egito manteria o desenvolvimento do avião e toda campanha de ensaios em voo.

O ano era 1964 e, finalmente, acontecera o primeiro voo do HA-300 V1, o voo de doze minutos foi comandado pelo Capitão Kapil Bhargava. Tudo aconteceu tranquilamente e os egípcios, indianos e os projetistas alemães ficaram satisfeitos com o resultado.

Alguns testes subsequentes foram feitos e, ao final, foram 135 voos realizados pelos dois protótipos (V1 e V2). Em um dos voos de destes com o piloto do Egito, Major Sobhy El Tawil, uma parte superior da asa foi arrancada, mas pesar do susto o major trouxe o avião para um pouso seguro.

Fim do projeto

Muito ousado, o projeto previa que um país africano teria independência no setor aeronáutico, em especial em um momento de graves tensões com Israel. Foi justamente quando o sonho foi interrompido pela Guerra dos Seis Dias (1967), contra a já poderosa Força Aérea de Israel.

Devido a situação, o Egito não teve outra saída e foi decidido cancelar o avião e comprar aeronaves já disponíveis no mercado, no caso soviéticas. O Egito saiu dos conflitos com Israel derrotado, endividado e sem um caça de última geração.

Kurt Tank

Kurt Tank

Tank além de projetista aeronáutico era piloto | Foto: Via Internet

A História deste grande homem da aviação deu muitas voltas, saiu da Europa, passou pela América do Sul, Ásia e África. Kurt Tank voltou para a Alemanha onde viveu até 1983 na famosa cidade de Munique.

As aeronaves desenvolvidas por Tank, desde o consagrado FW 190 aos jatos Pulqui II e HF-24 Maruter mostram as diferentes fases e ousadia deste grande personagem da história aeronáutica mundial.

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